![Escrever, descrever e sensações em Álvaro de Campos, por Luís ...](https://www.alagamares.com/wp-content/uploads/2014/03/images-8.jpg)
Álvaro de Campos é um dos heterônimos mais conhecidos de Fernando Pessoa. Nascido em Tavira, extremo sul de Portugal, no dia 15 de Outubro de 1890, teve uma educação, considerada pelo próprio Fernando Pessoa como vulgar, de Liceu.1 Posteriormente, foi para Escócia, em Glasgow, para estudar Engenharia, primeiro Mecânica e depois Naval. Contudo, não exerceu a profissão por não suportar ficar trancado em escritórios. Álvaro realizou uma viagem ao Oriente, durante umas férias, que resultou em seu poema "Opiário".
Desempregado, ele teria voltado para Lisboa em 1926, mergulhando então num pessimismo decadentista: o poema "Tabacaria", de 1928.
Características
De acordo com Fernando Pessoa, Álvaro de Campos era alto (1,75m de altura), magro e um pouco tendente a curvar-se.
Álvaro de Campos é um poeta moderno, que vive as ideologias do século XX. Engenheiro de profissão, vê o mundo com a inteligência de um homem que é dominado pela máquina. Com um temperamento rebelde e agressivo, seus poemas reproduzem a revolta e o inconformismo, manifestados através de uma verdadeira revolução poética.
Alguns dos poemas de Álvaro de Campos
- O Opiário:
O poema marca o surgimento desse heterônimo na cena literária, com uma mescla de ironia e melancolia, de angústia e piadas filosóficas, que sentimos imediatamente a justeza de sua fama.
O poema, originalmente, possui 43 estrofes, mas vamos utilizar apenas 8 delas para assim deixar você, nosso leitor, com gostinho de quero mais!
É antes do ópio que a minh'alma é doente.
Sentir a vida convalesce e estiola
E eu vou buscar ao ópio que consola
Sentir a vida convalesce e estiola
E eu vou buscar ao ópio que consola
Um Oriente ao oriente do Oriente.
Esta vida de bordo há-de matar-me.
São dias só de febre na cabeça
E, por mais que procure até que adoeça,
já não encontro a mola pra adaptar-me.
Em paradoxo e incompetência astral
Eu vivo a vincos de ouro a minha vida,
Onda onde o pundonor é uma descida
E os próprios gozos gânglios do meu mal.
É por um mecanismo de desastres,
Uma engrenagem com volantes falsos,
Que passo entre visões de cadafalsos
Num jardim onde há flores no ar, sem hastes.
Que passo entre visões de cadafalsos
Num jardim onde há flores no ar, sem hastes.
Fernando Pessoa (como Álvaro de Campos)
Opiário (estrofes 1 a 8)
- Tabacaria:
Este poema foi escrito em 15 de janeiro de 1928, por Álvaro de Campos.
Álvaro de Campos retrata uma angústia voltada para o tudo e para o nada. Revesando entre interioridade e cosmos e repleto de paradoxos e exageros, o eu-lírico parte em uma busca pela verdade permanente, marcado por uma consciência niilista de que é um conceito inalcançável.
Novamente, pelo fato de o poema ser extenso, vamos introduzi-lo com suas primeiras estrofes.
Fernando Pessoa (como Álvaro de Campos)
Tabacaria (estrofes 1 a 5)
“Não sou nada.
Nunca serei nada.
Não posso querer ser nada.
À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo.
Janelas do meu quarto,
Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é
(E se soubessem quem é, o que saberiam?),
Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente,
Para uma rua inacessível a todos os pensamentos,
Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa,
Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres,
Com a morte a por umidade nas paredes e cabelos brancos nos homens,
Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada.
Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade.
Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer,
E não tivesse mais irmandade com as coisas
Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua
A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada
De dentro da minha cabeça,
E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida.
Estou hoje perplexo, como quem pensou e achou e esqueceu.
Estou hoje dividido entre a lealdade que devo
À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora,
E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro.
Falhei em tudo.
Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
A aprendizagem que me deram,
Desci dela pela janela das traseiras da casa.
Fui até ao campo com grandes propósitos.
Mas lá encontrei só ervas e árvores,
E quando havia gente era igual à outra.
Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei de pensar? [...]”
Segue abaixo, uma foto da revista Presença, onde foi publicado o poema “Tabacaria”, em julho de 1933:
Figura 1 - Revista Presença
Fonte: Wikipedia.
Referências
Bibliografia de Álvaro de Campos. Disponível em: <https://www.pensador.com/autor/alvaro_de_campos/biografia/>. Acesso em: 19 abr. 2020.
FRAZÃO, Dilva. Álvaro de Campos. Heterônimo do poeta Fernando Pessoa. Disponível em: <https://www.ebiografia.com/alvaro_de_campos/>. Acesso em: 19 abr. 2020.
Fernando Pessoa (como Álvaro de Campos). Disponível em: <http://culturafm.cmais.com.br/radiometropolis/lavra/fernando-pessoa-como-alvaro-de-campos-opiario-estrofes-1-a-8>. Acesso em: 19 abr. 2020.
MARCHETTO, Arthur. O peso esmagador da realidade em “A Tabacaria”, de Álvaro de Campos. Disponível em: < http://www.aescotilha.com.br/literatura/contracapa/a-tabacaria-poema-alvaro-de-campos-fernando-pessoa/>. Acesso em 19 abr. 2020.
LESSA, Kathleen. TABACARIA (Fernando Pessoa). Disponível em: <https://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/259837>. Acesso 19 abr. 2020.
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