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Crônica: Ana Carolina



Poucos pores do sol atrás, estávamos eu e meu cachorro em um dos poucos parques da cidade que permitem a entrada de animais quando algo tirou-nos a paz: um pug que passeava livremente pelo local teve a brilhante ideia de confrontar meu boxer.
Descansávamos embaixo de uma amoreira; infelizmente, não era a época adequada para que me deleitasse com as maravilhosas frutas, eu fumava um cigarro enquanto meu companheiro, deitado e ligeiramente ofegante, assistia aos demais visitantes. De repente, vindo de lugar nenhum, um pug metido a rottweiler resolveu comprar briga com os 37 quilos e meio de puro músculo do meu cachorro.
Caro leitor, preste muita atenção, por favor, o tamanho diminuto e a pedigree de seu animal não são desculpas para deixá-lo perambular sem guia em espaços públicos. Mas enfim, em alguns fragmentos de segundos, aquela pequena aberração, fruto da superficialidade humana, estava a pouco mais de um metro de nós, com uma postura que assustaria pela agressividade se não fosse cômica pela aparência do animal.
Aliás, meus amigos amantes (ou não) de animais, que coisa assombrosa foi feita pelos homens durante o desenvolvimento dessa raça! E não foi algo isolado, como a façanha de Victor Frankenstein, demandou anos e mais anos para evoluir gradativamente nesses seres contrafeitos. E digo mais, a criaturinha não é barata não, custa centenas de reais!
Os coitados possuem uma gama enorme de problemas de saúde que são consequência direta da intervenção humana, a qual visava única e exclusivamente gerar de forma artificial essa aparência tão singular. Todas as características estéticas do pobre bichano resultam em sérias condições médicas, a ambição humana de brincar de Deus custou a eles a possibilidade de uma qualidade de vida satisfatória. Ele não respira direito, seu coração não dá conta do serviço, não anda certo, seus ossos - principalmente os da cabeça e as vértebras - são deformados, ele sofre de alergias e regularmente a morte desses animais é tão súbita quanto a inspiração de um escritor. Tudo isso para apetecer a vaidade se seus donos.
De qualquer maneira, em um movimento reflexo, coloquei-me entre ambos os cães e quando o pug tentou driblar-me, reagi pegando-lhe em meus braços. O pequeno monstrinho foi salvo e agradeceu-me da forma mais inesperada possível: o danado me mordeu! Felizmente, com um focinho tão atarracado, seu ataque doeu muito mais no orgulho do que machucou, de fato, minha mão.


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